sexta-feira, 30 de novembro de 2007

UM CONTO DE NATAL


SONHO DE NATAL

Num daqueles meus passeios nocturnos, em que entro pela floresta dos sonhos, afoito e decidido, olhando em redor e buscando em cada flor, em cada fraga, em cada pedra a razão de tão profunda curiosidade, encontrei-me como que por magia, no meio da encruzilhada do monte onde deixo muitos desses sonhos plantados ou enterrados.
Cansado, procurei assento num pedra ali bem perto de onde podia alcançar o infinito sempre que o quisesse. Não terá sido a primeira vez que ali estava porque a paisagem me era familiar. Acho que é naquela encruzilhada onde me encontro com todos os que me sobrevoam os pensamentos.
Ontem, de mansinho e passo curto, uma figura curiosa aproximou-se de mim, tocou-me no ombro e perguntou-me:
- Sabe dizer-me qual o caminho para Portugal?
Algo surpreso e encantado, respondi-lhe que estava com sorte porque eu era precisamente português. O meu País é já ali atrás. Eu vim de lá e costumo vir passear por estes lados.
- Mas olha quem é ele... disse eu num misto de interrogação e afirmação.
- Como vai o meu amigo, perguntei?
Admirado o velho senhor, da barriga farta e barrete enfiado pelas barbas, perguntou-me:
- Amigo? Que amigo? Nós nem nos conhecemos....
- Ora meu caro, conhece sim senhor. Então não é o Santa Claus o Papai Noel... o Pai Natal ou lá como lhe chamam?
De olhos bem abertos, que no meio das farfalhudas sobrancelhas pareciam minúsculos, voltou a questionar-me:
- Desculpe, eu sou de facto o... Santa Claus o Papai Noel ou o Pai Natal como me quiser chamar, mas... amigo? Sinceramente não me lembro de ter amigos da sua idade!
- Essa é boa, respondi. Pensei que o senhor fosse amigo de toda a gente. Mesmo de gente da minha idade...
E tem a certeza de que não se lembra de mim? Afinal escrevia-lhe tanta carta nesta altura do ano. Não se lembra?
- Não, respondeu-me. Sabe tanta gente me escreve que me é difícil identificá-lo sem mais nem menos.
- Pois, eu sei... ou melhor imagino, que eu nunca fui de contar a ninguém o que lhe escrevia nas minhas cartas, nem nunca quis saber o que os outros lhe escreviam. Mas as minhas cartas iam tão enfeitadas... Há quanto tempo...
- Acredito, deviam vir, disse, mas vêm todas, cada uma à sua maneira. Francamente mesmo tentando puxar pela memória não me lembro.
- Foram muitas, perguntou?
- Se foram... e tão compridas... por isso acho estranho que não se lembre. Olhe uma vez pedi-lhe um triciclo com campainha e tudo. Nunca o recebi.
- Meu caro, são tantos os triciclos que entreguei... o seu provávelmente terá ficado esquecido. Sabe eu ando velhote há muitos anos e ao fim de um certo tempo de entregas, sinto-me cansado. Já viu que na mesma noite tenho de correr mundo a entregar prendas?
-Pois... deve ter sido isso. Talvez o senhor tenha começado a sua distribuição por outro ponto do mundo e quando chegou a minha vez já não conseguiu chegar à chaminé. Foi pena.
- E lembra-se? De outra vez pedi-lhe uma bicicleta. Também nunca chegou a entregar-ma...
- O meu amigo teve azar, bem eu nem gosto muito de falar em azar, da terra de onde venho essa palavra não existe, mas caramba, apeteceu-me aplicá-la neste caso. Parece-me que dos seus pedidos pouca coisa lhe entreguei.
- Pois é. Mas sabe? Eu hoje percebi que mesmo que me tivesse querido entregar o que lhe pedi, era impossivel fazê-lo, é que com essa barriga como é que o senhor entraria pela chaminé da nossa casa? Percebo agora porque sempre me deixou pequenos brinquedos. A nossa chaminé era estreita. E eu que fiquei a pensar mal de si...
- Está com pressa, perguntei-lhe. Sente-se um bocadinho, atirei antes de receber a resposta.
- Amigo. olhe que engraçado, estamos para aqui a falar há tanto tempo e ainda nem sei o seu nome. Eu não lho perguntei e o senhor também não mo disse...
- Desculpe... tratou-me por amigo, foi? Ou ouvi mal?
- Não, não ouviu mal. Por norma não costumo perder tanto tempo nestes bosques de sonhos já cansados. Passo muito pelos outros mais fresquinhos, mas esses não querem conversas, querem é os brinquedos. Hoje foi uma excepção, por isso o tratei por amigo.
Mas diga-me, afinal como se chama?
...................................................................................................................................!
- Heim? Onde estou? Amor acordei? Que horas são?
- Dorme querido que ainda é cedo. Acordas-te com um pesadelo.
Um pesadelo... ia jurar que tinha estado com o meu Pai Natal. Não foi pesadelo foi um sonho.... mas parecia tão real...
Ora, aquele malandro vai continuar a passar ao lado da minha chaminé. Nem o nome tive tempo de lhe dizer....
Voltei a deitar-me e de relance lancei um olhar para a mesa de cabeceira onde guardo todas as noites o relógio e o crucifixo. Um pequeno pedaço de musgo cobria o pé do candeeiro. Ia jurar que o tinha visto na pedra onde estivera sentado à conversa com o Santa Claus.
Não sei, não consegui entender o que se tinha passado, nem consegui voltar a pregar olho, mas na manhã seguinte o presépio jazia nas caixas perto da lareira para ser montado.
A magia está de volta, mesmo sem triciclos ou bicicletas. Que importa isso? É Natal!
Os netos estão à espera! Acredito que tenham escrito ao Pai Natal embora não soubessem que o avô estivera a falar com ele durante a noite...

José Gonçalves

14 comentários:

Isamar disse...

Parabéns, Amigo! Ainda tens a capacidade de sonhar e muitos já a perderam.Já sabia que eras um sonhador e agora, este teu conto, veio confirmá-lo. Mas és muito mais do que um sonhador. Dizia António Gedeão que "sempre que um homem sonha, o mundo pula e avança" e tu pertences ao grupo que faz o mundo pular e avançar. Dás vida às fantasias da tua mente para poderes proporcionar dias de fantasia aos miúdos e graúdos que te rodeiam. Que belo encontro tiveste com o Pai Natal! E porque pensas mais nos outros do que em ti nem sequer te lembraste de lhe dizer o teu nome , coisa secundária, porque agora , o essencial, é fazer feliz quem já não sonha porque não é capaz ou não acredita nos sonhos porque nunca se concretizaram. Não tiveste o triciclo, nem a bicicleta mas tiveste o amor que te fez crescer em harmonia e paz. A tua chaminé era estreita mas vais fazer larga a chaminé das crianças da tua terra.
Valeu a pena percorrer montes e vales, fragas e penedias, de xisto e granito, para te vir conhecer.
Papai Noel. Obrigada por me teres dado a alegria de ler um conto tão bonito mesmo à horinha da deita.
Beijinhos e tem uma santa noite...de sonhos.

Branca disse...

Boa noite amigo,
Gostei da magia deste conto de Natal.Já nos traz um cheirinho dessa fantasia que nós adultos também gostamos.E quando há netos, como refere no final, voltamos a sonhar porque eles nos transportam para o seu mundo, para o reviver da infância.
Venho de ler o que deixou no meu espaço e se a si o interregno pareceu uma eternidade,a mim também, já vim cá esptreitar várias vezes para ver se algo se passava.Entretanto vi o post sobre saúde que comentei e fiquei feliz agora por ver este em primeiríssima mão.Vou já ler o anterior que me escapou. Também tenho andado com falta de tempo.A mãe está melhor, obrigada, chega amanhã a casa.Lá lhe darei o seu beijo.
Fica bem
Um abraço

Elvira Carvalho disse...

Que lindo José. Pena que o Natal não seja para todos. Pena que haja crianças que não sabem o que é o pai Natal e pessoas que não têem sequer que pôr na mesa na noite de Natal.
Um abraço e bom fim de semana

Belisa disse...

Viva!

Também adorei este conto de Natal! É bom sonhar e nesta época o Pai Natal, faz a alegria de algumas crianças.
Também é bom que faça a alegria de alguns adultos...pois se forem só tristezas....não há alegria de viver!
Aproveitemos pois os sonhos e seria bom podermos fazer de alguns deles uma realidade!
Como já não vinha fazer uma visita já há algum tempo estive a pôr em dia e quero dar os parabéns pelo "borrachinho" tão lindo que por aqui encontrei!
Saúde,paz,amor e algum dinheiro é o que eu desejo para todos e....

muitos beijos estrelados

amigona avó e a neta princesa disse...

Parabéns meu querido amigo...parabéns e obrigada por me fazeres tão bem a esta hora em que o dia começa a nascer...conseguiste fazer-me sorrir!
Gosto muito do Natal no que tem de amizade, de alegria nas crianças, mas cada vez mais esta época perde o brilho!Cada vez mais é comércio, cada vez mais os meninos não dão o valor às prendas...os que recebem prendas...desculpa Zé, o teuconto só devia permitir palavras lindas e aqui estou com uma lágrima noolho...o Natal é uma época tão injusta!Uns com tanto, outros sem NADA! Beijo amigo e um ÓPTIMO fim-de-semana...

António Inglês disse...

Bom dia Sophiamar

Eu acho que sonho mesmo acordado e que a minha vida é um verdadeiro sonho. Não um conto de fadas, mas um sonho mesmo.
Onde é que na vida real eu conseguiria uma família como a que tenho? Onde é que na vida real eu teria os amigos que tenho? Onde é que na vida real eu conseguiria estar sentado a escrever como o faço aqui?
Por isto acho que vivo mesmo um sonho.
A ti, agradeço-te o facto de pertenceres a esses amigos "especiais" e que me fazem sonhar todos os dias.
Sempre tentei levar a vida com um sorriso nos lábios e de sonho em sonho. Nem sempre o consegui, mas resta-me o consolo de o ter tentado sempre.
Quanto aos outros, pois minha amiga, essa tem sido sempre uma prioridade. Gosto de ver tudo à minha volta feliz, por isso gosto de dar. Nem sempre recebo o sorriso que procuro neles mas vou continuando. Não sendo à primeira, pelo menos à segunda ou terceira vou conseguindo arrancá-los.
Este meu Pai Natal, é um safado. Fartou-se de me prometer coisas e muitas deixou em casa.
Desejo-te tudo de bom, uma felicidade imensa e um bom fim de semana.
Mil beijinhos para distribuíres aí por casa como entenderes.
José Gonçalves

António Inglês disse...

Brancamar

Bom dia. Já lho disse num comentário anterior, mas volto a repeti-lo pois nunca é demais, espero mesmo que sua mãe esteja já em casa perfeitamente recuperada ou pelo menos a caminho da total recuperação.
Quanto ao Natal, confesso que é uma época que me faz mal. Deixou de ficar completo a partir do momento que deixei de ter ao meu lado muitos que o faziam sempre, e aqueles que mo transmitiram.
São os filhos e os netos, em especial estes, que me vão ainda trazendo alguma magia e vou tentado passar, ano após ano, com o sorriso nos lábios que esconde muita nostalgia e muita saudade.
Um bom fim de semana
José Gonçalves

António Inglês disse...

Elvira

Eu queria ter os braços do tamanho do mundo e poder abraçar toda a gente no Natal. Queria ainda que os meus braços não se cansassem desse abraço pelo resto dos dias do ano.
Queria ter um coração maior que o Universo e poder envolver todos nele.
Queria ser o dono do Mundo e mandar pôr na mesa de todos a melhor ceia que alguma vez sonharam. Queria ter poder para transformar as pedras em pão, e as lágrimas em leite para que não faltasse nada a ninguém sempre. Queria ter o poder de mudar o mundo e a mentalidade do homem para que não houvesse guerra nem fome e fosse-mos todos iguais e o amor fosse uma constante na vida de todos nós.
Não tenho estes poderes, nem apenas consigo ajudar da forma que gostaria, um amigo que atravessa dificuldades porque a vida não mo permite. Sou muito pequenino, os meus braços mal chegam ao chão e mesmo assim consigo abraçar muita gente.
Por isso, nesta época, gostaria apenas de sentir que são só uns quantos dias e que todos os restantes dias do ano os passo da mesma maneira e com o mesmo espírito de solidariedade para com os outros, mas principalmente comigo próprio. Quem não souber ser solidário consigo jamais o será com os outros.
Desejo-lhe um bom fim de semana e deixo-lhe um abraço sentido e para este tenho a certeza que os meus braços chegam aí.
José Gonçalves

António Inglês disse...

Bom dia Belisa

Já tinha dado pela sua falta efectivamente, mas sabia que voltaria.
O "borrachinho" que encontrou por aqui é um dos meus filhotes, hoje já um Doutor de que me orgulho muito.
Os sonhos comandam a vida, mas a vida nem sempre se deixa comandar. Somos nós homens e mulheres que temos a obrigação de continuar sonhando. Isso vai-me permitindo a mim, ir dando aqueles que estão à minha volta a possibilidade de ainda acreditarem nos sonhos que cada um deles vai tendo.
Se cada um de nós o fosse fazendo, este mundo seria de certeza muito melhor. Haveria mais paz, mais amor, menos fome, menos guerra.
Resta-me ser solidário e continuar a ser como sou, pois gosto de me ver ao espelho, pareço-me bem e sobretudo estou em paz comigo próprio.
Um bom fim de semana.
José Gonçalves

António Inglês disse...

Amigona Avó

Não era intenção minha pôr-te de lágrima ao canto do olho, mas já percebi que és como eu, ela está sempre pronta a saltar.
Esta época do ano deixou de ser para mim o que era pois sinto a falta dos que mo transmitiram e de outros que também já partiram. Mesmo assim tenho de ir tentando dar aos filhos e netos a mesma magia que me foi transmitida.
Gostaria também, como já disse à Elvira, de ter o poder de dar a todos aquilo que merecem.
Dentro das minhas possibilidades vou-o tentando, mas infelizmente são poucos a onde posso chegar.
Desejo-te um excelente fim de semana e quando estiveres coma neta, dá-lhe um beijinho forte deste teu amigo.
São elas que nos fazem continuar a acreditar que este mundo pode ser melhor.
José Gonçalves

avelaneiraflorida disse...

Amigo José Gonçalves,

Só posso responder com um sonoro HO,HO,HO!!!!!!

Que bom ter um pai assim! Que bom ter um avô assim!!!!
Com todo o carinho e amizade!!!!
BJKS!!!!!!!!

António Inglês disse...

Avelaneiraflorida

Pois o malandro do meu Pai Natal é um safado.
Eu tento seguir os exemplos que me deixaram, nada mais.
Ah... e porto-me bem, o meu Santa Claus é que não.
Um grande beijinho
José Gonçalves

Elvira Carvalho disse...

Obrigado amigo por esse abraço.
E que Deus o ajude como voc^deseja ajudar os outros.
Um abraço

António Inglês disse...

Obrigado Elvira

Deus tem-me ajudado mas vai continuar. Temos um pacto e sei que isso irá continuar a acontecer. É que Ele não dorme.
Que Ele a proteja também a si e a todos os que a rodeiam e de quem gosta.
Um abraço
José Gonçalves