domingo, 26 de outubro de 2008

O VELHO DA HORTA


IIIª PARTE

Vem a Mulher do Velho e diz: Hui! Que sina desastrada! Fernandeanes, que é isto?

Velho: Oh pesar do anticristo. Oh velha destemperada! Vistes ora?

Mulher: E esta dama onde mora? Hui! Infeliz dos meus dias! Vinde jantar em má hora: por que vos meter agora em musiquias?

Velho: Pelo corpo de São Roque, vai para o demo a gulosa!

Mulher: Quem vos pôs aí essa rosa? Má forca que vos enforque!

Velho: Não maçar! Fareis bem de vos tornar porque estou tão sem sentido; não cureis de me falar, que não se pode evitar ser perdido!

Mulher: Agora com ervas novas vos tornastes garanhão!...

Velho: Não sei que é, nem que não, que hei de vir a fazer trovas.

Mulher: Que peçonha! Havei, infeliz, vergonha ao cabo de sessenta anos, que sondes vós carantonha.

Velho: Amores de quem me sonha tantos danos!

Mulher: Já vós estais em idade de mudardes os costumes.

Velho: Pois que me pedis ciúmes, eu vo-los farei de verdade.

Mulher: Olhai a peça!



Velho: Que o demo em nada me empeça, senão morrer de namorado.

Mulher: Está a cair da tripeça e tem rosa na cabeça e embeiçado!...

Velho: Deixar-me ser namorado, porque o sou muito em extremo!

Mulher: Mas vos tome inda o demo, se vos já não tem tomado!

Velho: Dona torta, acertar por esta porta, Velha mal-aventurada! Saia, infeliz , desta horta!

Mulher: Hui, meu Deus, que serei morta, ou espancada!

Velho: Estas velhas são pecados, Santa Maria vai com a praga! Quanto mais homem as afaga, tanto mais são endiabradas!

(Canta)

Volvido nos han volvido,

volvido nos han:

por uma vecina mala

meu amor tolheu-lhe a fala

volvido nos han.

Continua...


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