terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

ENTRE MÃOS

*

Hoje vou contar-vos uma conversa que ouvi uma noite destas entre duas mãos. Não sei se seriam as minhas porque político não sou, mas fiquei com muitas dúvidas e achei curioso o diálogo.



- Oi, ó tu aí da esquerda, onde estás?

- É comigo que falas?

- Não és a mão esquerda?

- Sou e que importa isso, incomoda-te?

- Não, não me incomoda nada. Queria apenas falar contigo um bocadinho.

- Ouve lá eu não me dá jeito nenhum estar à conversa contigo a esta hora da noite. Isso não pode ficar para amanhã?

- Poder pode, mas porque não te dá jeito agora? Estás acordada não estás?

- Estou mas estou com um pesadelo...

- Ah, estavas a sonhar e tiveste um pesadelo...

- Nada disso, estou com um pesadelo de 110 quilos em cima de mim que não me dá muita margem para falar-mos.

- Percebo. Tens azar, eu estou aqui por cima e tenho outra mão em cima da minha. Por momentos cheguei a pensar que eras tu, mas depois vi que não. Os dedos eram mais finos e é mais leve que tu.

- Pois mas não sou e agora se não te importas deixa-me descansar para ver se aqui o nosso companheiro se volta para o teu lado.



- Vai demorar porque ele já esteve para aqui virado, ainda não há uma hora.

- Então vê lá o que tenho ainda de aguentar. Mal mexo os dedos.

- É lá então estás mesmo entalada...

- Pois estou. Já estive melhor. Ontem à noite percorri o corpo dessa que está aí do teu lado e senti-me bem melhor. Pele macia, aveludada, cheirinho agradável de amêndoas, curvas gostosas e sinuosas... enfim um toque suave e fino...

- Ouve, pára lá com isso que o que tu fizeste eu também fiz... Ou pensavas que esses prazeres eram privilégios da esquerda?

- Não te quis ofender. Aliás sei que fazes muitas coisas como eu e até algumas que eu não faço, ou pelo menos tenho mais dificuldade...

- Pois, vamos deixar-nos de pormenores que eu apenas quis conversar contigo.

- Eu bem te disse que não estava no meu melhor... tu é que puxas-te a conversa. E então que queres mais que eu te diga?

- Conta-me o que tens feito. Ontem estivemos juntas, entrelaçámos os dedos mas depois desapareces-te.

- Isso foi debaixo da torneira e a água estava fria, por isso te esfregaste tanto em mim...

- Não sou eu que mando esquerda, é ele, o que nos une, o que está aqui entre nós...

- Pois olha direita, se é ele então não anda lá muito bem. Tenho reparado que de vez em quando dá-lhe para te dizer que me batas, e isso por vezes dói. Podias ser mais meiga... bolas...



- Acabei de te dizer que é ele que manda. Ele é que me diz quantas vezes te hei-de agarrar, quantas vezes me hei-de esfregar em ti, quantas vezes tenho de abanar, quantas vezes tenho de te bater e outras coisas que te não digo.

- E que te diz mais? Também te manda mexer onde não deves?

- Estás a desconversar ou está-te a dar?

- Não sei qual o motivo da tua irritação. Olha cá por mim faço muita coisa que gosto e muita que não gosto. Nem sempre me agrada no que mexo ou agarro e muito menos quando ele me guarda no bolso. E tu também fazes coisas de que não gostas?

- Bem eu mexo-me um bocadinho mais que tu, mas depende. Vejo-te bastas vezes tomar o comando das operações e eu fico bem quieta. A maioria das coisas que faço, são do meu agrado e do dele, outras vezes são do agrado dele mas não do meu, e nem sempre são de cheiro agradável. Nem toda a porcaria cheira bem não é?

- Estás a baixar um bocadinho o nível da nossa conversa.

- Olha mas os níveis do que fazemos também nos são estipulados por ele. E aquilo que fazemos não é mais nem menos do que as outras mãos fazem. Se tenho que as fazer, porque raio não hei-de poder falar delas?

- És capaz de ter razão. Então já que estamos numa de desabafo, diz-me lá: que coisas fazes tu que eu não faça? És assim tão diferente de mim?


- Bem diferente serei pouco, digamos que nos completamos uma à outra, agora dizer-te o que faço que tu não fazes, desculpa mas não te digo...

- Essa é boa! Acabas-te de dizer que nos completamos. Estamos ambas agarradas ao mesmo tipo gordo e anafado, mexemos nas mesmas coisas e que saiba vemos-nos uma vez por outra e chegamos mesmo a estar largos minutos agarradas. É verdade que quando ele anda, se tu vais para a frente, eu venho para trás e vice-versa mas isso eu pensava que era para o equilibrar e isso faz parte do complemento uma da outra. Agora estares com reservas em dizer-me o que fazes que eu não faça, é que não lembra ao Diabo...

- Pois, mas sabes, ele sempre me disse para não dizer à mão esquerda o que a direita faz. Desculpa lá.

- Sabes que mais? Vai dormir que isso passa-te... este gajo só pode ser político...

Fotos da Net

José Gonçalves

12 comentários:

Luís Galego disse...

bem interessante esta conversa de mãos...

Isamar disse...

Que uma e outra se completam não tenho dúvida nenhuma e que esse indivíduo gordo a que elas estão agarradas, que em breve estará mais magro, é um doce homem que as usa para afagar todos quantos ama também não duvido nem um bocadinho. Que as tuas mãos continuem, por muito tempo,a acarinhar aqueles que te rodeiam e a quem, certamente, deixas muito feliz.
Beijinhosssss

Rakel Macedo disse...

Lindo texto :)

Elvira Carvalho disse...

uito interessante e bem escrito este texto Amigo. Gostei imenso.
Um abraço

Branca disse...

Muita imaginação José. Um belo e interessante texto, com um fino sentido de humor.
Deixo-te beijinhos.

António Inglês disse...

Luís Galego
Antes de mais quero agradecer-lhe a sua visita.
Foi apenas uma pequena brincadeira e nada mais.
Um abraço
José Gonçalves

António Inglês disse...

Sophiamar

Eu bem queria abraçar todo o mundo com elas mas são insuficientes.
Vou fazendo o que posso e esta conversa da treta não foi mais que uma brincadeira de momento.
Mil beijinhos
José Gonçalves

António Inglês disse...

Rakel Macedo

Gostou a menina? Ainda bem.
Mãos são mãos.
Gostei de ver a "princesa" mas cuida bem dela.
Um beijinho
José Gonçalves

António Inglês disse...

Elvira

Andava um bocado farto de transcrever para aqui textos copiados ou compilados. Por isso resolvi escrever este pequeno texto sem muito interesse mas que serviu com interlúdio para que eu me sinta mais calmo.
Um grande abraço
José Gonçalves

António Inglês disse...

Mana Branca

São coisa que vão saindo sem que eu as prepare convenientemente. Foi uma brincadeira sem grandes pretensões e nada mais que isso.
Um grande beijinho
José Gonçalves

Maria disse...

Achei engraçada a conversa das duas mãos...
Jamais me passaria pela cabeça fazer um texto destes...
... mas não deixei de notar que foi a mão esquerda que disse "este gajo só pode ser político... "....

Beijinhos, José

António Inglês disse...

Maria

De vez em quando dá-me para isto... são coisas da idade...
Não se reparas mas é sempre a esquerda quem está por baixo, e é a direita quem faz coisas que a esquerda não sabe...
Qualquer semelhança com a política é pura coincidência...
Um beijinho
José Gonçalves